“Meu filho não era só mais um”: mãe de Gabriel cobra prisão de PMs
Fernanda Ferreira diz que Gabriel estava desarmado e foi executado. Recepcionista do DHPP, ela diz que cruzou com o PM que atirou no filho
atualizado
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Mãe do jovem Gabriel Ferreira Messias da Silva, morto por um policial militar na zona leste de São Paulo, em novembro de 2024, a recepcionista Fernanda Ferreira, de 39 anos, não se conforma que os agentes envolvidos no caso ainda não tenham tido a prisão decretada pela Justiça.
“Todo mundo vê essas imagens e só pedem o afastamento deles?”, questiona a mãe, citando as gravações das câmeras corporais que mostram um comportamento suspeito dos agentes e indicam, segundo a Defensoria Pública, que os PMs plantaram uma arma no local do crime para incriminar Gabriel e alegar legítima defesa (relembre o caso abaixo).
As imagens mostram o sargento Ivo Florentino dos Santos, que atirou em Gabriel, ordenando que outro PM vire para o lado, enquanto ele se agacha ao lado da moto do entregador. Na sequência, Ivo diz que encontrou uma arma no local. Cenas anteriores mostram, no entanto, que não havia nenhuma arma perto da moto ou de Gabriel antes daquele momento.
Outra câmera flagrou, ainda, Ivo chutando uma arma para debaixo da moto. Veja as cenas:
“Já está provado que meu filho foi assassinado, foi executado”, diz Fernanda, sem conseguir conter o choro. Em entrevista ao Metrópoles, ela diz que está há seis meses em busca de justiça para o filho.
“Durante esses últimos seis meses, eu não sei o que é dormir, não sei o que é comer direito, vivo na base de remédios e calmantes. A minha luta é constante pela justiça. Meu filho tinha sonhos, tinha planos, tinha família. Ele não era só mais um”, desabafa a mãe.
Fernanda afirma que todos os processos envolvendo o caso têm sido conturbados e sem transparência.
No dia em que Gabriel foi baleado, ela diz que a equipe médica do Hospital Ermelino Matarazzo falou para a família que ele havia sofrido uma parada cardíaca após um acidente de moto. O pai e a mãe do jovem contam que só souberam que o filho havia sido baleado ao ouvir o comentário de uma segurança sobre o caso e, mais tarde, quando receberam os papéis do óbito.
Fernanda afirma que chegou a procurar a Ouvidoria da unidade para abrir uma reclamação, mas que uma funcionária se negou a atender a solicitação. Ao Metrópoles, a Secretaria Municipal de Saúde disse que o protocolo prevê que o registro na Ouvidoria seja realizado diretamente pelo munícipe, de próprio punho.
A secretaria também informou, em nota, que o paciente citado pela reportagem deu entrada no hospital já em óbito, em novembro do ano ado. “Nesses casos, o corpo é encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML), responsável pela elaboração do laudo final.”
Sumiço de pertences
Outro problema, ela conta, foi o “sumiço” dos pertences de Gabriel. A pochete e os cartões, entre outros objetos que estavam com ele, nunca foram devolvidos à família.
“Ninguém sabe onde foi parar nada. […] Eu quero o capacete do meu filho pelo valor sentimental. A moto sumiu, a bolsinha dele sumiu, cartão bancário, chave de casa, ninguém me entregou nada, absolutamente nada.”
Mãe atendeu PM em recepção
Como acontece sempre em um caso de morte por intervenção policial, o assassinato de Gabriel é investigado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil. Fernanda conhece bem o protocolo desses crimes: ela é recepcionista do DHPP.
No início deste ano, foi ela quem atendeu, na recepção, o policial que atirou em Gabriel quando ele esteve no departamento para dar sua versão sobre o caso.
“Eu dei de frente com ele, quando ele foi dar o depoimento. Fui profissional, deixei ele se apresentar, coisa que ele não fez com meu filho”, afirma.
A recepcionista diz que o filho nunca pegou em uma arma e que todos no bairro o conheciam como um garoto trabalhador. O jovem era funcionário de uma pizzaria e atuava fazendo entregas.
Amiga da família, Teila da Silva, também descreve Gabriel como um menino tranquilo. “Conheço o Gabriel desde novinho. Era carinhoso, educado, tímido, trabalhador. Ele trabalhava desde os 14 anos.”
Teila afirma que o jovem tinha saído para ear naquela noite e que provavelmente quis fugir da abordagem dos policiais com medo de que a moto fosse apreendida. O veículo estava sem placa e Gabriel não tinha habilitação.
“Infelizmente, ele ficou com medo de uma abordagem. A moto era o sustento dele. Ele estava sem habilitação, mas estava tirando [a CNH], a gente tem um comprovante que ele estava fazendo as aulas.”
A família conta que Gabriel tinha perdido a placa da moto, mas já tinha encomendado uma nova. A placa substituta chegou no dia do enterro do jovem.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública diz que os policiais envolvidos estão afastados e que o Inquérito Policial Militar (IPM) foi concluído e encaminhado ao Poder Judiciário para análise.
“Paralelamente, a Polícia Civil conduz investigação sobre o caso por meio do DHPP, sob sigilo, com o objetivo de esclarecer todas as circunstâncias”, afirma a pasta.
O Metrópoles não conseguiu contato com o soldado Ailton. Por telefone, o sargento Ivo disse apenas para a nossa reportagem procurar a assessoria de imprensa da Polícia Militar.