Funk e terreiro: confira o estilo ancestral confortável de MC Tha
Cria de Tiradentes, periferia de São Paulo, a cantora reflete as referências musicais, religiosas e culturais no momento de se vestir
atualizado
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No começo da música Comigo Ninguém Pode, presente no álbum Rito de á, lançado em 2019, uma voz canta: “Vai na fé que dá certo”. A frase dita com força e doçura, paradoxalmente, exemplifica o trabalho construído até aqui por Thais Dayane da Silva, a MC Tha. A paulistana tem traços musicais no funk, mas se consolidou ao unir o estilo com gêneros diversos e com um denominador comum: a origem na população negra brasileira. De maneira original, Tha cria uma atmosfera sonora e visual que têm conquistado a crítica e fãs por todo o país.
Essa liberdade para misturar elementos cercam também as escolhas de MC Tha no âmbito da moda. Para a artista, o foco principal é se sentir “confortável”. Ela diz não se enquadrar nos padrões estabelecidos para as mulheres na música brasileira atualmente. Vestidos, saias e camisetas largas, associados ao espaço do terreiro, unem- se a óculos juliet, bonés e tênis, itens característicos entre os jovens da periferia, como peças que fazem parte do guarda-roupa ancestral da cantora.
Vem conhecer mais!
Abram os caminhos
Cria do bairro de Tiradentes, na zona Leste de São Paulo, Thais Tayane da Silva é um dos exemplos potentes musicais que surgiram a partir das periferias brasileiras. Com um início de carreira focado no funk, a MC Tha, agora, é diferente daquela dos tempos juvenis.
“Dos 15 aos 18, eu cantava funk no meu bairro, mas sempre sofri por ser diferente. Não me sentia confortável em vários momentos, principalmente quando queria me colocar em uma caixa padronizada”, revela em entrevista à coluna.
Após um período cantando em bailes funks, Tha resolveu pausar a carreira musical. A volta foi incentivada com o apoio do cantor Jaloo, em 2014. Desde então, a artista não parou mais. Com singles avulsos, como Céu Azul e Bonde da Pantera, o nome MC Tha foi se tornando cada vez mais popular, até que em 2019, a cantora lançou o primeiro álbum, intitulado Rito de á.
O disco reúne as principais influências sonoras e culturais da artista. O funk permanece, mas com o acréscimo de batidas pop e instrumentos da Umbanda, religião da qual é praticante, com um resultado autêntico e brasileiro.
Esse caldeirão de influências se reflete nas peças escolhidas para os clipes e shows. “Começo a pensar a MC Tha muito a partir do conforto. Sinto muita dificuldade de subir no palco com uma roupa que não estou me sentindo bem”, explica.




Ancestral do futuro
Em 2022, MC Tha lançou o EP Meu Santo é Forte. O novo trabalho repagina as canções afrobrasileiras da cantora Alcione, lançadas por volta dos anos 1970 e 2000. A artista leva de volta a rainha do samba para o terreiro e acrescenta as batidas de funk, além de apresentar a maranhense a uma geração mais nova.
De acordo com Tha, a proposta seria unir as ancestrais — ela se identifica como a “ancestral do futuro”. Para isso, propõe uma modernização, tanto nas músicas como na estética das roupas.
No que diz respeito às escolhas das peças, Tha compartilha que é a própria responsável por se vestir. “Para o show novo, eu dei uma aprofundada nas minhas pesquisas. Utilizo elementos de terreiro e do funk nas minhas vestimentas. Eu mesma faço todo o styling, pois adoro me virar, explica”. Ela acrescenta: “Adoro ir a brechó, vou muito. Gosto de garimpar, porque sei que não vou encontrar [o que quero] em fast fashion, por exemplo”.




Festival Urgente
O público de Brasília pôde conferir de perto o trabalho de MC Tha durante a agem dela no Festival Urgente. O evento ocorreu no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no último sábado (4/2), como um pré-evento carnavalesco da cidade.
A cantora animou o público brasiliense com os principais hits do repertório, ostentando o melhor estilo MC Tha: vestido preto acetinado amarrado com uma espécie de cinto metalizado. Os itens com essa pegada, aliás, têm sido utilizados como elementos visuais dessa nova era da artista.
Por ser a própria responsável por seu styling, MC Tha acredita que o processo tem vantagens. “Gosto eu mesma de me vestir, pois é uma forma de me conhecer mais. Eu gosto particularmente de tudo o que fiz até aqui”, finaliza.




Com um trabalho independente, MC Tha tem construído um legado de bases sólidas. Do seu modo e tempo, ela demonstra que não há necessidade de se enquadrar em rótulos e caixas para se sentir bem e realizada.
“Sou subproduto, vim do lixo para beijar o luxo. Fora dos padrões, mato leões e ainda te lanço insulto”, canta em Avisa Lá. Que a mensageira ancestral do futuro continue influenciando na música e na moda.