Cogumelos mágicos: entenda qual é a importância dos fungos na natureza

A ciência já descreveu aproximadamente 150 mil espécies de fungos, mas existem ainda muitos mistérios no mundo dos cogumelos: estima-se que existam quase 4 milhões de espécies no planeta que pertencem a este reino.

No grupo dos fungos estão os bolores, cogumelos comestíveis, esporos quase invisíveis e também o maior ser vivo conhecido do mundo: fungo Armillaria ostoyae que ocupa 9 km² em Oregon, nos Estados Unidos, o dobro do tamanho do Parque da Cidade de Brasília.

Mais de 90% da biodiversidade destes organismos ainda permanece desconhecida, indicando um vasto campo a ser explorado, mas o que já se sabe sobre eles impacta a alimentação, saúde e indústria globalmente.

A diversidade invisível da vida fúngica

A dificuldade de identificação de fungos se deve, em parte, à capacidade deles de ocupar variados habitats. Eles vivem no solo, dentro de plantas, na água, em raízes, em tecidos animais e até no organismo humano, o que dificulta sua detecção e classificação taxonômica.

Apesar da pouca visibilidade, a atuação dos fungos é crucial. A função ecológica mais relevante desses organismos é a decomposição: eles degradam matéria orgânica e devolvem os nutrientes ao ambiente, permitindo que o ciclo natural da vida prossiga.

Muitos fungos formam relações simbióticas com plantas, como as micorrizas, que conectam-se às raízes e ampliam a absorção de água e nutrientes. Em troca, recebem carboidratos da fotossíntese. Essa relação fortalece o desenvolvimento vegetal e permite até o desenvolvimento de plantas que não fazem fotossíntese.

Outro exemplo de simbiose ocorre nos líquens, em que fungos se associam a algas ou cianobactérias. Essas estruturas pioneiras são capazes de colonizar ambientes extremos, como rochas e solos pobres em nutrientes, e têm papel importante em formar o solo, explica o agrônomo Lorenzo Rolim, Fundador da Smush, startup brasileira de alimentos enriquecidos com cogumelos funcionais.

“Os fungos são os recicladores da natureza. Eles atuam na decomposição da matéria morta, mantendo o ciclo da vida e atuando em simbiose ou contato com matérias que, para a maioria dos seres vivos, são extremamente tóxicos. Já achamos até fungos se alimentando de radiação dentro da usina abandonada de Chernobyl, uma coisa absolutamente fantástica. Sem estes organismos, os ecossistemas entrariam em colapso”, resume Rolim.

Cogumelos usados na alimentação

O uso dos fungos em alimentos é ancestral. O fermento biológico usado para fazer pão, por exemplo, é produzido pela levedura Saccharomyces cerevisiae. Eles também participam da fermentação de cervejas, queijos, vinhos e da bebida kombucha, consumida por suas propriedades probióticas.

Além disso, há também os famosos cogumelos comestíveis, como champignon, shiitake e shimeji. “Além do sabor, eles são altamente nutritivos — ricos em proteínas, vitaminas e minerais. Diversos estudos e iniciativas buscam ampliar o cultivo desses fungos, inclusive em países com insegurança alimentar, para fornecer uma fonte alternativa e ível de nutrição”, explica a bióloga Andrea Libano, coordenadora de Ciências Biológicas do Ceub.

Além dos mais famosos, na alimentação também ganham destaque os chamados cogumelos funcionais, como o Lion’s mane, associado à melhora cognitiva, e o Cordyceps, usado por atletas por seu efeito sobre a oxigenação do sangue. O mercado de uso dos fungos tem crescido no setor de suplementos e nutrição.

Fungos na saúde

Os fungos deram origem também a medicamentos essenciais. O mais conhecido é o Penicillium notatum, de onde foi isolada a penicilina, primeiro antibiótico amplamente utilizado e que revolucionou a história dos tratamentos de saúde: antes dele, a expectativa de vida humana era menos da metade da atual.

Outro exemplo é o Aspergillus terreus, produtor de estatinas, medicamentos que controlam o colesterol e reduzem o risco cardíaco de diversas pessoas. Por estas aplicações, a biotecnologia está explorando compostos fúngicos para criar novos fármacos.

Doenças causadas por fungos

Algumas espécies, no entanto, representam riscos e parecem até saídas de filmes de terror. Dezenas de espécies de fungos são capazes de parasitar seres vivos e transformá-los em zumbis, especialmente aranhas e formigas.

Outros fungos podem ser ameaçadores para a saúde humana. O Candida albicans, por exemplo, causa a candidíase em situações de desequilíbrio no organismo. Há também organismos dermatófitos como o Trichophyton, que são responsáveis por frieiras e outras micoses cutâneas comuns.

“Embora sejam uma minoria na imensa diversidade fúngica, espécies como o Cryptococcus e o Aspergillus podem causar infecções graves e até potencialmente fatais, especialmente em pessoas com imunidade comprometida”, explica a professora de biologia Aline Costa Botelho, da Maple Bear Brasília.

A histoplasmose, também conhecida como doença do pombo, por exemplo, é causada pela inalação de esporos presentes em fezes de aves e morcegos e pode ser fatal. Fungos resistentes também estão entre as infeções mais difíceis de combater em sistemas hospitalares.

Um universo a ser desvendado

Fungos sustentam a vida no planeta, promovendo equilíbrio ecológico, inovação científica e benefícios à saúde humana. A complexidade de suas interações, usos e impactos ainda está longe de ser totalmente compreendida, mas o reconhecimento de seu valor cresce a cada nova descoberta.

Pesquisas avançam na criação de materiais biodegradáveis a partir de fungos, substituindo plásticos, e embalagens tradicionais têm avançado. Estruturas feitas com micélio já são utilizadas em arquitetura, design e até na confecção de roupas e calçados. Dependendo da forma que eles são manipulados, os cogumelos podem se tornar tão rígidos quanto o concreto.

“Fungos são aliados invisíveis da vida na Terra, mas ainda sofrem com desinformação. Entender sua dualidade, os que trazem benéficos e os que são prejudiciais, permite aproveitar seu potencial sem subestimá-los”, resume Rolim.

Explorar e preservar a diversidade fúngica é essencial para o futuro. Fungos são mais do que organismos do subsolo: são parte vital da engrenagem da Terra mesmo que muitas vezes invisíveis.

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