O que está acontecendo com a Amazônia em 10 perguntas e respostas
As queimadas de fato bateram recorde? O desmatamento subiu? Em dúvida sobre as muitas questões envolvendo a Amazônia nas últimas semanas?
atualizado
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A Amazônia virou o foco das atenções nas últimas semanas com notícias sobre aumento do desmatamento e das queimadas, com declarações polêmicas do presidente Jair Bolsonaro e com intensa repercussão internacional. Entenda:
1. A Amazônia está queimando mais neste ano?
O número de focos de incêndio para todo o Brasil entre 1º de janeiro e 24 de agosto era o maior dos últimos sete anos para este período. O Programa Queimadas, do Inpe, registrou até a data 79.513 focos, alta de 82% em relação ao mesmo período do ano ado. Desde 2013, o ano com maior número de focos para esse intervalo de tempo tinha sido 2016, com 74.317 focos. Aquele foi um ano bastante seco, com ocorrência de um forte El Niño. A Amazônia (o bioma) respondeu por 52,5% dos focos deste ano. Até o dia 24, a região teve 41.867 focos, ante 22.165 nos oito primeiros meses do ano ado e 36.333 no mesmo período de 2016. Comparando somente o mês de agosto, houve mais focos do que este ano em 2005 (63.764), 2007 (46.385) e 2010 (45.018). O ano de 2005, como mostra a resposta acima, foi o último recorde de desmatamento da região e 2010 foi um ano extremamente seco.
2. A questão envolve só o Brasil?
Não. A Amazônia colombiana também tem queimadas e o país solicitou apoio a outros países. Já a Bolívia informou ontem que aceitará a ajuda externa para conter os incêndios, oferecida por Chile, Paraguai e Espanha. Ali os incêndios já consumiram mais de 745 mil hectares de terra na região de Chiquitania, na fronteira com o Paraguai, e 100 mil hectares em Beni, na Amazônia boliviana.
3. Já existe uma explicação para essas queimadas?
A principal correlação encontrada até o momento é a alta no desmatamento. A principal hipótese de especialistas é que queimadas estão ocorrendo para limpar o que foi derrubado antes. A explicação vem da Nasa. Segundo o pesquisador Doug Morton, isso é possível de aferir com uma análise das colunas de fumaça que podem ser vistas por satélite. Elas têm uma espécie de que mostram sua origem. Não são de fogo espalhado e mais baixo, que seria o indicador de queima de resíduos de campos de cultivo ou para limpeza de pasto, por exemplo, mas são centralizados e muito altos, de pilhas de troncos de árvore queimando que tinham ficado ao sol secando por meses antes.
4. A culpa pelas queimadas pode ser da seca?
Este ano de fato está mais seco, mas não tanto quanto estava 2016. O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) divulgou uma nota técnica no dia 20 avaliando essa possibilidade, mas também concluiu que a maior correlação é com o desmatamento. Analisando os dados disponíveis até o dia 14, notou-se que “os dez municípios amazônicos que mais registraram focos de incêndios foram também os que tiveram maiores taxas de desmatamento”. Segundo os pesquisadores do Ipam, esses municípios, até o dia 14, eram os responsáveis por 37% dos focos de calor em 2019 e por 43% do desmatamento registrado até o mês de julho na região.
5. Há indícios de quem está cometendo essas queimadas?
Os focos de queimadas estão espalhados por todo o chamado arco do desmatamento, que vai do Acre, ando por Rondônia, sul do Amazonas, norte do Mato Grosso e sudeste do Pará. Ao menos no Pará, no entorno da BR-163, há uma investigação corrente, depois que foi anunciado por um jornal de Novo Progresso que produtores locais estavam convocando um “dia do fogo” no dia 10 de agosto. De fato, o Programa Queimadas do Inpe viu um aumento de incêndios na região naquele dia e os Ministérios Públicos Estadual e Federal estão investigando a questão. Neste domingo (25/08/2019), o presidente Bolsonaro pediu à Polícia Federal que também investigue o caso do Pará.
6. Houve aumento do desmatamento no Brasil?
O número oficial usado pelo governo para divulgar os dados de desmatamento anual da Amazônia – do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) ainda não foi divulgado (isso deve ocorrer até novembro), mas números obtidos com uma resolução um pouco menor indicam que sim. O sistema Deter, também do Inpe, que faz detecções rápidas com satélite para orientar a fiscalização em campo, observou um aumento de 49,62% no corte da floresta entre 1.º de agosto do ano ado e 31 de julho deste ano (período histórico de análise), em comparação com os 12 meses anteriores. Os alertas do Deter observaram a perda de 6,841 km² neste período, ante 4.572 km² no período anterior. Apesar de ter uma resolução menor, nos últimos anos a tendência vista pelo Deter é confirmada posteriormente pelo Prodes.
7. Outros sistemas confirmam isso?
Outros sistemas de monitoramento independentes confirmaram a tendência de alta. O SAD, da ONG Imazon, indicou para esse período alta de 15%.Instituições estrangeiras, como a Nasa e a Universidade de Maryland, que também monitora florestas em todo o mundo, também constataram alta no desmatamento da Amazônia nos últimos 12 meses. Já o governo Bolsonaro itiu que houve um aumento no corte da floresta, mas ressaltou que isso vem ocorrendo desde 2012. A gestão disse que talvez a perda não seja tão alta quanto mostrou o Deter e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a destacar alguns erros do sistema (que tem acurácia em torno de 90%).
8. Houve desmatamentos maiores no ado?
Sim. Os anos de 1995 e 2004 tiveram as maiores taxas de perda da floresta – 29.059 km² e 27.772 km², respectivamente, de acordo com o Prodes, do Inpe, que calcula a perda anual da floresta (entre agosto de um ano a julho do ano seguinte) desde 1989. Em 2012, observou-se o menor nível histórico – 4.571 km².
9. Como foi a reação do governo?
A crise teve início em 19 de julho. Inicialmente, o presidente Bolsonaro disse que os dados de alta do desmatamento do Inpe eram “mentirosos” e que seu diretor estaria “a serviço de alguma ONG”. Depois o governo itiu que o desmate estava subindo, mas disse que isso era uma tendência desde 2012, e negou que os números fossem tão ruins – também se anunciou a contratação de um novo sistema de monitoramento, e o Ibama abriu um edital para isso. Sobre as queimadas, o governo também primeiramente alegou sensacionalismo, disse que o problema não era tão grave assim e até acusou ONGs de colocarem fogo na floresta. Após a repercussão externa, considerada exagerada pela gestão Jair Bolsonaro, o governo lançou uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO, um convênio com Estados que permite o uso de tropas das Forças Armadas em intervenções) e envio agentes da Força Nacional para os Estados da região.
10. E a repercussão internacional?
A maior parte dos veículos de mídia internacional destacou o avanço das queimadas, utilizando dados do Inpe, corroborados pela Nasa. Na maior parte das vezes, a postura adotada trouxe críticas ao governo, visto como sem interesse pela área. A cobertura e o tom subiram após o presidente francês Emmanuel Macron cobrar o Brasil pela imprensa e até dizer que foi enganado por Bolsonaro – que rebateu as queixas. Neste domingo, 25, o G-7 (grupo dos países mais ricos e industrializados) anunciou que daria apoio aos países amazônicos para conter o fogo.